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LIS-FNC-BRU…à conversa com Hugo Antunes

À conversa com Hugo Antunes

Hugo Antunes, fala-nos de ti: quem és, por onde tens andado e o que te faz feliz…

Sou músico/compositor, toco contrabaixo e baixo eléctrico em várias vertentes musicais nomeadamente jazz, rock, improvisação livre, pop, hip-hop e fusão.

A música, apesar de sempre presente na minha vida, surgiu apenas aos 26 anos como profissão. Até então, tinha trabalhado como técnico de óptica ocular (oculista) e tinha frequentado o curso de Direito.

Quando decidi enredar pelos estudos musicais comecei pelo Hot Clube de Portugal, que me conduziu a viver em Amesterdão (para estudar contrabaixo no conservatório), a Paris (a convite duma cantora para integrar o seu grupo e a partir daí percorrer França inteira a tocar) e, mais tarde, à Bélgica, enquanto bolseiro Inov-Art.

Sou original do Barreiro, mas a minha vida profissional na música foi-se consolidando mais a partir de Lisboa, onde actualmente vivo alternadamente com Bruxelas.

A felicidade para mim está sempre relacionada com conquistas pessoais e desafios profissionais ultrapassados, tal como com o bem estar de quem me rodeia. A minha família, o seu desempenho profissional, bem como equilíbrio emocional, têm um papel muito importante nesse processo de me sentir feliz.

– O que te liga à Madeira?

A minha ligação ou conexão à Madeira surge num contexto familiar, porque o lado materno da família da minha mulher é madeirense.

Desde então que a Madeira é o sitio onde passamos férias e onde inclusive a minha filha mais velha acabou por nascer. Desta forma fui criando também relações de amizade com pessoas originalmente madeirenses ou que, por alguma razão, vivem na ilha.

-Alguma particularidade/curiosidade acerca dos madeirenses que queiras partilhar?

O madeirense para mim é uma pessoa que por regra gosta de festejar, de celebrar a vida e de sorrir. A ideia que tenho de quem vive na Madeira é de alguém com qualidade de vida, alguém que por viver numa ilha com sol, mar e com tempo disponível consegue viver a vida descontraidamente.

Serão poucos os locais na Europa em que se pode dar um mergulho no mar à hora de almoço e ter tempo para tomar um copo num fim de tarde entre amigos.

O madeirense para mim é um misto disso com o legado dum povo que convive há séculos com a condição de Região Ultra Periférica.

– Qual é o teu lugar favorito na Madeira? E já agora em Bruxelas, e em Lisboa…;)

O meu lugar favorito na Madeira é o Porto Santo, porque representa estar entre amigos numa praia de areia com água quente e comida fantástica. É como se duma viagem no tempo se tratasse.


O meu sitio preferido em Bruxelas, é a casa dos amigos que lá fiz ao longo destes 9 anos.

Em Lisboa, o meu local preferido é o da portugalidade presente em todos os gestos do dia-a-dia. Que me perdoem o Norte, o Sul e as ilhas que tanto adoro, e que sem dúvida ajudam a compor todo esse sentimento, mas Lisboa invoca-me O´Neill, Pessoa, Almada Negreiros (mesmo que não lisboeta) e Carlos do Carmo. Traz-me um sentimento de pertença enorme.

– Qual foi a melhor refeição que fizeste na Madeira?

As melhores refeições que fiz na Madeira até hoje foram os peixes que o amigo Roberto pescou, sempre muito bem cozinhados pela amiga Patrícia; foram as massadas deliciosas do meu amigo Bruno; foram os bodiões na Fajã dos Padres; foram as refeições com pratos tradicionais em família, aquando do Natal e Ano Novo; e foram as lapas que o amigo Silvestre colheu e cozinhou para todos nós, quando amavelmente nos convidou para um passeio de barco até ao Calhau da Lapa.

– Onde mais gostas de viver?

O meu local preferido para viver é onde a minha família se sente bem e feliz. No entanto, gostaria de terminar os meus dias em Lisboa. É a cidade da minha morte.

– Fala-nos da tua música…consegues defini-la?

A música que desenvolvo é muito pessoal e não se rege por factores externos. É música que respeita uma narrativa interna. Uma lógica e forma resultantes do que sou. Nós somos aquilo que comemos e eu tento respeitar e aceitar esse princípio.

-De onde vem a tua inspiração?Tens algum herói musical?

A minha inspiração é o resultado directo dum mergulho e duma apneia muito grande até ao centro do meu ser. Raramente se traduziu em entretenimento, por muito que as minhas filhas gostariam que assim fosse. A minha mais nova está precisamente neste momento a tentar ultrapassar, decifrar e compreender porque razão a música que o seu pai desenvolve não é ouvida nas rádios, não é falada em revistas e jornais. É muito difícil para uma criança de oito anos perceber que o que o seu pai desenvolve tem valor não sendo reconhecido.

No entanto, tento passar que o que faço é único, algo que mais ninguém o poderia fazer e que, por essa e outras razões que não gosto de enumerar, não ganha expressão, nem cria tração junto do “grande público”.

Heróis para mim são todos os artistas que apesar de não terem apelidos pomposos e de não terem nascido privilegiados, apesar de não fazerem parte de lobbies ou de não elencarem em carteiras de artistas de agências que controlam o meio, lutam e sobrevivem diariamente, sem retorno monetário, por um lugar ao sol, por uma oportunidade e por um reconhecimento que teima em chegar. Esses para mim sim são a verdadeira Cultura. São a memória dum povo e têm valor maior. São sem dúvida alguma a minha maior fonte de inspiração.

– Qual foi o melhor elogio que recebeste?

O melhor elogio que recebi foi a amizade e respeito musical do meu amigo Paul Lovens, meu grande mentor na improvisação livre. Tudo o que vem do Nastio e do N´Du foi e é amor também em forma de elogio. Há pouco tempo, fui convidado pelo artista Carlos Nogueira para tomar um chá e conversar. Esse convite foi um dos maiores elogios que alguma vez recebi e representa tudo para mim.

As criticas também acariciam este ego amarrotado, mas o que estes artistas, alguns jornalistas e público fiel me transmitem é muito mais importante.

– Tens algum bar favorito de música ao vivo e porquê?

Há um sitio que, pela importância que teve no meu crescimento, pelas conquistas e frustrações musicais vividas, bem como pela acústica em si, se tornou o meu clube preferido: o ardido, o antigo, Hot Clube na Praça da Alegria. Desde então, tudo mudou e muito dessa mudança não foi para melhor. Não falo só de instalações.

– Que lição tiraste da quarentena, ou como sobrevive um músico à quarentena?

A maior lição que retirei da quarentena foi que a família, a sua união e solidariedade são o que de mais importante tenho na vida. Tudo isto foi-me revelado pela tomada de consciência de que durante 46 anos fomos vítimas de uma total incompreensão por parte do Estado pelas profissões que compõem o inexistente estatuto de artista. Algo que se traduziu num abandono deplorável e absoluto duma classe que tanta riqueza cria. Somos um meio totalmente exposto e sem direitos, só com deveres e obrigações. Nós artistas somos a real imagem da falência democrática do Estado de Direito.

– Onde podemos encontrar-te/ouvir-te?

Poderão ouvir-me com RAN em Agosto: dia 18 no Penha SCO em Lisboa; dia 19 no Bota em Lisboa; dia 20 no Cine Incrível em Almada; dia 21 no Jazz na Praia na Lourinhã. De resto há o meu Bandcamp e outras contas da mesma plataforma com discos em que participo onde me poderão ouvir e apoiar.

– O teu lema é?

O meu lema é: “baixa a cabeça e trabalha mais arduamente”. “não há méritocracia mas tu ficas a dever ao Mundo cada vez que não crias, portanto…” por isto e tudo o resto sou um Estoico.

Muito Obrigada Hugo.
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This blog talks about the island where I was born and live - Madeira, and my endless journey to discover the world until (one day, who knows) I get to visit Mars.

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